11 dezembro 2003

Conselhos para encontrar um amor no verão

A cada ano, inelutavelmente, quando o verão se aproxima, a imprensa nos propõe pautas animadas por uma questão recorrente: como encontrar um amor (ou vários) neste verão?

Não são apenas incitações festivas a libidinagens estivais. Às vezes, aliás, elas são acompanhadas de conselhos para prolongar as paixões de verão e, quem sabe, transformá-las em amores eternos enquanto durem.

Seja como for, é aceita universalmente a idéia de que o verão seria a melhor estação para achar os parceiros ou as parceiras que fizeram falta no inverno.

Claro, durante as férias, todos têm mais tempo e disponibilidade para dedicar-se a essa tarefa. Mas a razão principal que faria do verão a estação dos namoros parece ser outra: no verão, a gente tira a roupa (ao menos em parte) e sai da toca. É o momento de ver e ser visto, de escolher e ser escolhido.

Deve ser por isso que uma parte relevante dos conselhos para um verão namoradeiro são, de fato, sugestões estéticas: como perder aqueles cinco quilos em três semanas, como achatar o estômago, como esculpir os abdominais, como tornear as pernas e arrebitar as nádegas, como conseguir um bronzeado natural e dourado, qual maquiagem usar na praia, como escolher a sunga ou o biquíni certos, como desembaraçar o cabelo depois da água salgada, como vestir-se nas baladas da noite e por aí vai.

Por que não? Afinal, para encontrar um namoro, é preciso seduzir, não é?

Certo, mas não deixa de me surpreender que os conselhos para encontrar companhia sejam quase sempre dicas para nossa aparência. Ou seja, a vontade de achar alguém com quem valha a pena ficar (ao menos um pouco) se traduz em anseios narcisistas. Saímos à procura de um outro para beijar e acabamos embaciando o espelho.

Poderia ser engraçado, se não fosse triste e regular, na volta das férias, o catálogo das decepções. Não havia ninguém que valesse a pena. Ou, se havia, não vi. Quer dizer, havia um cara que não parava de olhar, mas eu não devolvia, claro. Quando levantou e veio na minha direção, abracei-me à minha amiga: "Fala, fala, pelo amor de Deus, faz de conta que estamos num daqueles papos que não dá para interromper". Ou, então, havia, sim, aquela mulher que passava a cada dia na frente da varanda, mas eu ia lhe dizer o quê? "Com licença, minha senhora, estou sozinho e a fim de companhia"?

As praias e os calçadões dos balneários se transformam em arenas de um estranho jogo do desencontro: muitos convergem proclamando planos de amores e conquistas, todos desfilam para que os olhares cruzados confirmem a força de atração de seu "look", mas poucos se permitem um gesto que poderia alterar a máscara que eles compuseram para seduzir.

A razão dessa situação é simples. É possível que cuidemos de nossa imagem na intenção de agradar ao outro, mas esse cuidado é um obstáculo a qualquer encontro ou relação. A perfeição almejada e arvorada como instrumento de sedução seria inevitavelmente comprometida se revelássemos nosso desejo. A arma da sedução (minha imagem malhada, bronzeada e produzida para seduzir) me reserva uma sina de solidão, pois ela pede também que, sendo perfeito ou perfeita, eu mostre ao mundo que não preciso de ninguém.

A mulher que receia parecer atrevida ou pouco pudica, o homem que teme mostrar-se babaca de tanto carente são vítimas do mesmo impasse narcisista: as condições para eles serem desejáveis incluem a impávida demostração de que nada lhes falta.

Em suma, o narcisismo, querendo tornar todos (ou quase) desejáveis, impede a todos de desejar.
Pensando bem, como estação dos namoros, seria preferível contar com o inverno. Quem sabe, na penumbra de um bar, protegidos por casacos e cachecóis, a gente se esqueça um instante dos requisitos da fachada sedutora, baixe a guarda e consiga confessar faltas, desejos e vontades.
Uma lembrança. Aos 16 ou 17 anos, não me lembro direito, passei uma semana de férias em Rimini, na Riviera Adriática. Éramos um pequeno grupo de moços sedentos de aventuras, depois de um inverno de aulas de grego e latim. Todos imaginávamos e antevíamos paixões avassaladoras. Mas só um de nós as vivia: Jimmy, um jovem que nós não achávamos nem grande sedutor nem especialmente bom de papo, voltava a cada dia, ou melhor, a cada noite, para a pensão com uma companheira. O grupo reagiu desdenhosamente: afinal, as moças não eram aquelas deusas com as quais sonhávamos. Mas logo quisemos saber o segredo de Jimmy.

"Qual é o truque, o que você faz?" Jimmy explicou: ele abordava, sistematicamente e sem hesitar, todas as moças e as mulheres que lhe parecessem minimamente agradáveis. Claro, frequentemente a coisa não dava em nada. Ele era, cotidianamente, ignorado ou rechaçado 20, quiçá 30 vezes; para a população feminina do balneário, devia ser um estorvo, mas sempre havia ao menos uma para abrir o sorriso e aceitar um convite. Ficamos estupefatos: o segredo era que Jimmy não tinha medo de uma recusa, nem vergonha de seu desejo. Para ele, simplesmente, as feridas do amor-próprio contavam menos do que sua vontade de não ficar só.

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