25 janeiro 2001

A MISÉRIA DO CAPITAL 1

Preliminares

CONTARDO CALLIGARIS
EM PORTO ALEGRE

Qual é , para mim, a relevância do fórum?
A realidade econômica da globalização pode ser violenta, mas também pode ser corrigida. Aliás, os impasses (e os horrores) são óbvios até para muitos dos que estão em Davos.
Preocupa-me mais não o Consenso de Washington, mas o nosso próprio consenso. Ou seja, a facilidade com a qual, nas últimas três décadas, as classes médias ocidentais mais bem-intencionadas acabaram pensando que os sonhos progressistas teriam sido enfim realizados (ou quase). Por exemplo, "ser livre" é poder escolher produtos num mercado aberto e mundial.
"Participar democraticamente" é poder investir on line, sem intermediários.
"Ser informado" é dispor das mesmas informações do que dispõem os investidores institucionais. "Desenvolvimento" é crescimento do PIB. E por aí vai.
Parece que, por malícia ou por preguiça, sem que nos déssemos conta, os termos com os quais pensávamos nosso futuro foram desvirtuando-se. Do Fórum Social Mundial espero, sobretudo, isto: que devolva seu alcance a algumas palavras. Não seria pouca coisa.
A cada dia (ou quase), apresentarei brevemente um projeto utópico discutido no fórum (ou em seus bastidores). Também criticarei uma idéia feita contestada (ou adotada) aqui.

Utopia do dia
Para limitar o poder político de empresas e corporações, uma reforma das leis de financiamento das campanhas eleitorais (a começar pelas americanas) adotaria o seguinte princípio: só os cidadãos, singularmente, devem ser autorizados a financiar candidatos e legendas, pois só os cidadãos, singularmente, votam. Para evitar espertezas, haveria uma contribuição máxima por votante - digamos, por exemplo, cem dólares. Também seria permitido financiar apenas um candidato ou uma legenda por eleição -ou seja, não mais seria possível contribuir com as campanha de todos para ser sempre credor de quem ganhasse. Se os fundos levantados fossem insuficientes, teríamos campanhas mais breves, mais concretas e menos espalhafatosas. É um problema?

Idéia feita do dia
Nos anos 90, triunfou a idéia de que pagar aos trabalhadores com ações ou opções seria uma nova forma de todos controlarem o processo produtivo. Eram ultrapassados o capitalismo démodé da velha economia e o socialismo derrotado: graças às ações possuídas, os trabalhadores seriam proprietários. Problema: as oscilações do valor de ações e opções têm pouquíssima relação com os esforços dos trabalhadores-acionistas. Ou seja, a distribuição de títulos não cria nenhuma participação concreta. Por exemplo, imaginemos que uma empresa tenha sido racionalizada, eufemismo para dizer que ela demitiu 10 mil funcionários. As ações sobem. Os desempregados, que levam consigo seus pacotes de ações e opções, devem ficar tristes ou alegres?

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